Isso que você tem sentido ao longo da Pandemia é medo.

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Tempos difíceis temos vivido. A cada dia que passa fica mais nítido como as coisas estão incertas no mundo. É muita gente desempregada, muitas pessoas adoecidas, são problemas de todos os lados.

imagem do pixabay

Nas redes sociais a gente vê de tudo e consegue sentir como as pessoas estão e são e, normalmente eu acompanho as redes prestando atenção no comportamento das pessoas. Um exercício quase automático que faço é procurar por outras respostas e não somente a mais evidente que surge em minha mente, provavelmente eu já esteja condicionado a perceber a vida sempre pelo que existe por trás dela e não o que fica nítido na primeira impressão.

No consultório as consultas também têm me feito pensar e buscar respostas para o que tem acontecido com as pessoas. Hoje eu tenho muitos pacientes desanimados, muitos estão piorando em seus quadros ansiosos, muitos estão tão desesperançosos que cogitam parar o tratamento e muitos têm sentido o impacto de conviver com familiares também adoecidos e ou em adoecimento. A saúde mental de todo mundo tem pedido socorro (Você pode se interessar por este texto aqui também “Tem muita gente perdendo o sono por causa do coronavírus“). Ela tem gritado com megafone, mas poucos conseguem perceber porque a saúde mental nem sempre se manifesta somaticamente, ou seja, como uma doença no corpo, na maioria das vezes ela se mostra através do comportamento “apenas”.

A pandemia no Brasil tem tomado um ritmo diferente de muitos lugares no mundo. Nós que já viemos de alguns anos com bastante divisão política percebemos o quanto isso é evidente mesmo diante de um problema de saúde pública como esse que estamos vivendo.

Temos no país um lado defendendo o isolamento social horizontal e do outro o isolamento social vertical. Para além das divergências de opiniões e das explicações teórico/conceitual para o manejo da questão, me permito falar sobre como percebo isso tudo de acordo com meu olhar clínico como psicólogo e posso presumir que estamos diante de uma experiência que tem nos exposto diretamente ao medo.

As pessoas estão com medo, muito medo. Isso que você tem sentido ao longo da quarentena por causa da pandemia é medo. Independente qual seja sua opinião sobre a melhor forma de conduzir a situação você está com medo.

Muitas pessoas estão com medo de morrer. Isso não é algo pra se espantar, é só olhar os noticiários sobre a pandemia que automaticamente você pode ser inundado por esse sentimento. É fato que o vírus pode matar, independente de se estar em grupos de risco ou não. Além disso, Existem os que têm medo por familiares ou pessoas próximas. Eu mesmo confesso que temo pelos meus (filho, pais, irmãos, amigos e pacientes). Estamos todos sentindo na pele algo novo que nunca havíamos sentido antes.

Posso apontar também que do outro lado existem os que têm medo de passar necessidades. Sim, o Brasil é um país pobre se a gente pensar que temos mais pobres que ricos. A distribuição de renda aqui é muito desigual, portanto é mais fácil encontrarmos pessoas com dificuldade de se manter no fim do mês do que o contrário. Então, muitas pessoas que defendem o retorno ao trabalho não são grandes empresários como alguns pensam (embora esses também façam isso e não quero discutir isso aqui neste texto), muitos são pais e mães temerosos com o amanhã, se terão ou não o dinheiro pra pagar o aluguel ou oferecer algo de comer para os filhos. Ou seja, são pessoas que também estão com medo.

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Estamos diante de um dilema pra nós humanos que impõe a necessidade de buscarmos alternativas diferentes das que parecem óbvias para cada um, para cada lado, pois os impactos de nossas decisões serão de amplitude coletiva. Assim, é interessante a gente pensar se vale a pena discutir com as pessoas neste momento. Será que vale mesmo a pena? Estão todos com medo como eu disse, será que vale a pena querer convencer o outro de que o medo dele é mesquinho ou pequeno frente ao seu? Penso que isso não resolverá a questão, ou seja, discutir com seu conhecido ou familiar, ou até mesmo aquele colega lá da rede social não vai resolver nada, porque estamos todos tomados pelo medo.

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O medo desperta em nós o mecanismo de sobrevivência e se perceber sendo conduzido por um caminho diferente de sua verdade que, à princípio protege sua vida, fará você reagir. É isso que tem acontecido com as pessoas, elas estão reagindo com medo de a verdade do outro sobrepor a dela porque isso significa se expor ao risco de morrer ou passar dificuldades financeiras (o que impacta outras questões). Estamos lidando com o medo numa amplitude tão grande, numa esfera social mesmo e por isso torna todo esse momento uma experiência complexa.

Não existe medo maior ou medo na experiência de cada um. O medo é subjetivo. Muitos têm experimentado ansiedade, outros depressão, outros têm estado tão angustiados que não conseguem denominar o que sentem, mas estão todos tomados por muito medo. Não se esqueça disso…

Permita sentir esse medo. Aceite que ele existe dentro de você e no outro.. Precisamos nos unir pra encontrarmos uma solução que impacte menos, apenas menos porque sabemos que qualquer decisão terá impacto. Mas não miniminize o medo alheio, não rotulo o próximo, não desfaça amizade porque o medo do outro é diferente. Só temos medo porque somos humanos… permita-se pensar, sentir e viver diferente.

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Maicon Moreira
Maicon Moreira
Psicólogo Clínico (CRP 05/54280), Especialista em Psicoterapia Cognitiva e Doutor em Psicologia pela UFRRJ. Atua como Terapeuta Cognitivo comportamental e Junguiano. Tem formação em Terapia Cognitiva, Terapia do Esquema, e Terapia da Aceitação e Compromisso. Tem interesse nos seguintes temas: Psicoterapia Cognitiva, Psicologia Analítica, Violência Psicológica, Saúde Mental e Autoconhecimento, Memória Social, História da psicoterapia e Formação do Masculino.

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