Alô? Marcelo, você vem me buscar quando?
– Acho que por volta das 20 horas, pode ser?
Pode sim, vou te esperar…
– Fechado então. Estou com saudade tá… Te amo.
Ok.
– Ok significa o quê?
Que eu também gosto de você Marcelo.
– Você podia ser mais carinhosa às vezes. Eu sinto falta disso…
Já falamos sobre isso, eu não sei lidar muito com essas coisas, me desculpe. Mas eu gosto de você. Acredite!
Esses dias eu estava pensando em como é lindo ver as pessoas demonstrando afeto. Quando eu vou ao cinema e vejo uma cena triste ou romântica percebo as pessoas em volta se debulhando em lágrimas e eu não consigo sentir nada. Acho que eu sou uma pedra.
Sabe, eu sempre fui assim desde pequena. Não consigo me enturmar com muita gente, sempre acho um exagero ter muitos amigos, afinal de contas, as pessoas são falsas mesmo ou pelo menos não são tão amigas quanto acreditamos. Eu também acho uma palhaçada ficar abraçando as pessoas ou chorando dizendo que está com saudades. Aff…….. Eu já me sinto vacinada faz tempo das pessoas, comigo todo mundo anda no cabresto, se der mole eu piso no pescoço mesmo. Eu sou assim…
Eu tô falando isso pra vocês entenderem um problema que eu tenho vivido ultimamente. Meu namorado, o Marcelo, é um cara muito legal, nós estamos juntos já faz 2 anos e eu o amo demais. Eu nunca pensei que encontraria um cara tão legal pra dividir a vida, mas isso aconteceu e eu agradeço sempre à minha Nossa Senhora por isso. Ele é carinhoso, romântico, atencioso, fiel, é difícil limitar as qualidades porque ele tem muitas mesmo. Nós estamos com alguns problemas no momento em nosso namoro e percebi que sou eu a causadora de tudo.
Há uns 4 meses o Marcelo quis conversar e disse que eu não o amava. Quando ele disse: “Thais, precisamos conversar sobre nossa relação” eu gelei, pensei que iria terminar comigo e me senti muito mal. Mas ele não terminou, na verdade, ele está insatisfeito sim e queria conversar pra melhorar as coisas.
Marcelo reclama que eu não demonstro animação quando estou com ele, disse que estou sempre distante, que dou pouca atenção, e pareço desligada do nosso namoro, que não me importo de ligar pra ele fora dos horários combinados, que às vezes sou um pouco rude, não demonstro afeto mesmo, interesse sabe… além de não me enturmar com os amigos que temos em comum.
Ele tem razão no que fala, realmente eu não consigo ser próxima das pessoas. Nunca fui. E acredito que mudar isso nessa altura da vida seja pouco provável. Também me sinto desconfortável em ficar dizendo que gosto, ficar de mela-mela com as pessoas, acho isso tão chato… Sabe quando as pessoas se abraçam no fim do ano ou se emocionam no dia do aniversário? Nunca fiz. Não que eu me lembre. Meu apelido na escola era “coração gelado” e eu nunca me importei com isso. Eu não falo “eu te amo” nem pra minha mãe, é desnecessário né…
Eu sempre me resolvi sozinha sobre as coisas que sinto, mas eu me importo com o que ele sente, com as pessoas a minha volta, eu só não consigo ser diferente. Perceber isso foi difícil e só aconteceu depois dessa conversa com ele porque pra tentar resolver a questão eu fui buscar ajuda de um psicólogo.
Descobri que normalmente eu travo na frente das pessoas, não sei aonde colocar as mãos, que as palavras fogem de mim, eu me sinto burra… Eu penso de forma acelerada sempre e não concluo nenhum pensamento. Fico tão insegura, tenho medo de chorar na frente das pessoas e pagar mico, ser rejeitada, ser chamada de chorona, de fraca. Percebi que não demonstro sentimento pra fugir da possibilidade de sofrimento, da rejeição, do abandono. Eu morro de medo do Marcelo me deixar, então fico com medo de demonstrar sentimento, me envolver e ele ir embora.
Ter percebido isso foi bom e ao mesmo tempo péssimo, porque eu sei que preciso aprender a lidar com essas emoções. Eu sinto tanta coisa boa, gosto de tantas pessoas, só não consigo demonstrar, não consigo me sentir segura pra isso… Por isso prefiro guardar tudo, fingir que nada se passa dentro de mim, que sou mesmo um coração gelado. Mas eu não sou.
Ainda estou aprendendo sobre mim…
Nenhum de nossos contos retrata o caso de algum paciente atendido por nós. Trata-se de uma ilustração da vida cotidiana, de histórias que motivam pessoas a procurarem terapia/psicoterapia.
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