Em 2010, eu tive a oportunidade de participar de um curso na UFRJ sobre “Indicadores Sociais com ênfase em Relações Raciais”. O curso, voltado para professores (minha primeira graduação foi em História), tinha como objetivo refletir sobre a questão racial, contribuindo para o aperfeiçoamento de profissionais que fossem pôr em prática a lei 10.639/03 sobre o ensino da História e Cultura Afrobrasileira e Africana.
Nessa época conheci mais sobre a História da África, sua cultura, sua geografia, suas influências no território brasileiro e também os grandes desafios que existiam e, ainda existem, para a população do Brasil em geral. Ali eu pude também conhecer pessoas envolvidas com a militância do movimento negro e com isso ouvir histórias, dores, dificuldades, que eles e pessoas próximas vivenciavam no dia a dia.
Apesar de ser neto de uma mulher negra e ter outros familiares negros, eu nasci branco, tenho a pele clara, cabelo liso, e isso não impede de eu ter a consciência e o esclarecimento de que não passei e não passo por nenhuma das dificuldades que ouvi lá nas reuniões/aulas que participei (inclusive eu era ali um forasteiro, tendo em vista que a maioria era negra). Hoje, enquanto psicólogo, eu atendo algumas pessoas que trazem como demanda o racismo estrutural posto em prática de diversas formas, como por exemplo, pelo preconceito escrachado ou também aquele preconceito velado (o racismo à brasileira de Da Matta), a sexualização de seus corpos, e ou até as dificuldades no mercado de trabalho, etc.
Vejo o racismo como uma dor que dói na alma, porque é assim que eu sinto toda vez que ouço eles dividirem sua dor com os olhos marejados. É como se ninguém conseguisse compreender todas as violações que acontecem dia após dia simplesmente pelo fato de terem nascidos negros. Uma das coisas que eu já ouvi e que mais me machuca é um pai temer pela ida de seu filho na rua porque ele pode ser confundido/visto com um bandido somente pela cor da pele 😞…
Por este motivo sinto-me incomodado com discursos do tipo: “Precisamos Comemorar o Dia da Consciência Humana”. Isso me incomoda porque, assim como eu pude perceber há 09 anos que eu não vivia aquelas dores, percebo que a maioria das pessoas que defendem esses discursos também não, mas falam/tecem comentários desmerecendo essa dor e a luta de quem bravamente busca sobreviver (este é o termo mais adequado) neste mundo complicado e difícil chamado Brasil. Se posicionar assim é falta de empatia com a dor e dificuldade do outro, é ignorar tudo o que a gente vê nos jornais do país, é sacramentar que, de fato, existe uma necessidade de encobrir a existência dos 300 e poucos anos de escravidão no Brasil.
Espero que um dia possamos de verdade lutar pelo Dia da Consciência Humana… Isso será lindo e importante para o avanço da nossa sociedade também. Mas, por ora, em virtude de tudo o que acontece com a população negra de nosso país, que é a maioria por sinal, comemorar e reconhecer a importância do Dia da Consciência Negra é indispensável/Indiscutível.
Se você deseja comemorar o Dia da Consciência Humana comece reconhecendo que humanos negros foram escravizados em nosso Brasil e ainda hoje percebemos o quanto esse período triste de nossa História é vivo na pele de muitas pessoas. Além disso, se você não vive essa dor diretamente, se você não conhece alguém que já tenha passado ou passa por ela, se este é um assunto ao qual você ignora o ano todo ou discorda, não dê sua opinião. Certamente seu silêncio fará menos mal que seu posicionamento contrário a uma causa que não te comove.
Dia 20 de Novembro – Dia da Consciência Negra SIM.
Se você deseja falar conosco ou está em busca de ajuda para si ou para alguém, clique aqui.