Escrevo este texto porque semanalmente sou questionado aqui no site ou em minhas redes sociais se trabalho com atendimento com valor social, por isso decidi explicar como entendo a questão e também como pratico.
De antemão, esclareço que a orientação do Conselho Federal de Psicologia (CFP) sobre publicações de preços por nós profissionais da área é clara. Não podemos utilizar os valores dos atendimentos como uma forma de captação de clientes/pacientes, por isso a maioria de nós psicólogos (as) não publica os valores cobrados pelos atendimentos, normalmente deixamos para informar isso ao paciente quando nos procuram.
Nota técnica Nº 01 / 2022, chamada “Publicidade Profissional: Preço e Trabalho Voluntário“:
“Quando da divulgação dos serviços profissionais, orienta-se que o preço não seja usado como forma de propaganda, conforme disciplina o art. 20, alínea “d” do CEPP, abstendo-se de utilizar termos como: preço social, atendimento social, desconto, pacote promocional, valor acessível e similares e demais termos que façam referência a vantagem financeira do serviço. Informa-se também que não é permitido o uso de cupons promocionais e sorteios. Por sua vez, a divulgação de convênios com instituições, universidades, faculdades, clínicas é permitida. A divulgação de trabalho voluntário não está impedida, dessa forma a psicóloga e o psicólogo devem analisar a viabilidade do atendimento e apenas oferecê-lo quando puderem garantir a continuidade e a qualidade do serviço. É inadequado o atendimento voluntário com a finalidade de captação de clientes.”
Assim sendo, considerando essa orientação do CFP e indo direto ao ponto, no meu entender o atendimento com valor social (valor mais acessível) é aplicado para pessoas que não conseguem arcar com o investimento convencional que fariam pelo acompanhamento psicológico (terapia/psicoterapia), ou seja, o preço cheio que o profissional cobra por seu atendimento/trabalho. Normalmente essas pessoas passam ou estão passando por questões pontuais e ou históricas que as colocam nessa condição de necessitar o acompanhamento psicológico e não conseguirem investir em si. Por exemplo, poderia citar as pessoas que ganham salários baixos, as que estão em crise financeira (por um período específico), as que estão desempregadas, etc. Portanto, o atendimento com valor social é aplicado a esse público como uma forma de contribuição social do profissional que de forma responsável, ética e por iniciativa própria, escolhe ajudar a sociedade com o seu conhecimento.
Desde quando eu iniciei os atendimentos como psicoterapeuta desejei contribuir socialmente de alguma forma por isso até hoje separo algumas vagas considerando mais ou menos os exemplos acima. Evidentemente reconheço que esse esforço é insuficiente diante da necessidade da sociedade, mas faço o que posso e me sinto privilegiado de poder ajudar. Inclusive, até mesmo os textos que eu publico aqui e em minhas redes sociais enxergo dessa maneira, são pensamentos que ajudam a refletir a vida e isso também é um auxílio. Assim sendo, quando alguém me questiona sobre atendimento com valor social e tenho vaga disponível, normalmente agendo um primeiro atendimento e ali avalio se essa pessoa se enquadra ou não no perfil e, em caso negativo, fico disponível pelo valor convencional (cheio) e ela decide se continua em acompanhamento comigo ou se procura outro psicoterapeuta.
Sobre os valores, como não existe uma obrigatoriedade para essa prática também não existe uma regra estabelecida para o valor aplicado. Desse modo, tudo depende da análise que o profissional faz da realidade do paciente/cliente para definir o que seria um “valor acessível”, por isso esse valor pode ser de R$ 10,00 ou qualquer outro menor ou maior que isso. Ou seja, não existe regra…
Eu penso ser importante trazer essa reflexão por dois motivos: O primeiro é que infelizmente vejo muitos colegas se aproveitando dessa terminologia para criar quase que um nicho de trabalho, quando, na verdade, como disse, ele se configuraria mais como uma ação social. Esse primeiro ponto acaba por conduzir ao segundo porque diz respeito a forma como as pessoas de um modo geral têm procurado por esse tipo de atendimento. Eu associo uma coisa a outra porque somos nós profissionais que educamos a sociedade sobre o que fazemos e como fazemos, e se as pessoas têm identificado essa terminologia em muitos lugares e estão associando como sinônimo de “pesquisa de mercado/preço” nós profissionais somos também responsáveis por isso. Assim, penso que em hipótese alguma essa nomenclatura “atendimento social” ou “atendimento com valor social” devia ser utilizado como estratégia mercadológica no cenário profissional, porque ele funciona/serve como uma ação social e não como nicho de trabalho.
Esclareço que é normal pesquisar vários profissionais e decidir pelo que você gostou mais considerando o valor cobrado. Isso acontece em qualquer profissão e não seria diferente na psicologia. Mas o ponto aqui é outro, é considerar esse termo “atendimento com valor social” como uma pesquisa de mercado, ou como um nicho de algum profissional, ou como sinônimos, e tudo isso são coisas completamente diferentes e muitos profissionais não refletem sobre isso. Como expliquei, atendimento com valor social seria mais uma espécie de ação social realizada pelo psicólogo (a); já uma pesquisa de mercado é algo que realizamos o tempo todo e não tem a ver com “ação social”; e nicho de trabalho é a área que o profissional estuda e decide atuar e também não tem a ver com uma “ação social”. Viu, são coisas diferentes.
Às vezes vejo algumas postagens e anúncios de colegas que estranho muito porque parece que eles se veem em uma espécie de “feira de atendimento com valor social” onde ganha o cliente o profissional que cobra mais barato. Nesses casos, se existisse um bordão para representar a questão seria mais ou menos assim: “Alô dona Maria, aqui está mais barato, vem agendar…“. E não é isso :(… Diferenças de mercado é comum, pesquisar preços também, mas o significado de um atendimento com valor social, eu repito, seria para auxiliar uma parcela da população configurando-se praticamente uma ação social. Para mim não ter esse esclarecimento ou ignorar esse foco significa confundir a sociedade como um todo.
Para finalizar, aproveito para esclarecer que a escolha de um psicólogo/psicoterapeuta não devia ser pautada apenas no valor que ele cobra, simplesmente porque a experiência da psicoterapia é diferente de uma consulta médica por exemplo. Em uma consulta médica a gente fala os sintomas ao profissional e ele nos dá um diagnóstico, faz prescrição de exames, medicamentos, etc. Na psicoterapia não acontece assim. Apesar de também realizarmos diagnóstico e falarmos sobre sintomas (que podem ser muitas coisas e não necessariamente um sintoma enquanto adoecimento em si), nela você fala de si, você se abre para uma outra pessoa, então não adianta ir ao profissional mais barato se não conseguir criar conexão com ele e tudo na psicoterapia depende dessa conexão (estabelecimento da relação terapêutica).
Se quiser falar comigo ou se estiver à procura de ajuda para si ou para alguém entre em contato.